quarta-feira, 25 de junho de 2014

Carta ao Amigo Palhaço


Meu caro amigo palhaço.

Sinto que o deixei de lado naquele domingo azul de maio, onde o céu era limpo e meus olhos, marejados de cinza, contemplaram a mais bela harmonia com lua em plena luz do dia. Meu sorriso farto estava fadado a reviver nostalgias num peito áspero, já gasto do aperto e da correria daqui. Mas não se preocupe, estou bem, tenho sido cuidadoso ao me aventurar nos olhos alheios, ao deliciar-me nas bocas, que me sorriem apenas por fora. Tenho devolvido discreto, os risos singelos que tencionam o ar, constrangidos de uma febre global de milhões de solitários que se esquivam dos nossos olhos. Tenho me repetido nos erros, isso não vai me ocorrer novamente. Mas sempre digo isso.

Mas estou feliz pelas manhãs, acordo logo cedo e já levanto sonhando e rotina mudando aos poucos até o meu jeito de andar.
Eu já não falo mais porrrrtão, mas posso abrir algumas portas pra você aqui, patife.
Além de portas, estou de olhos e ouvidos bem abertos, por sinal. Estou me dando alguma injeção, ou vírus e, já, me vejo diferente. Até as ruas, as pessoas, gestos, detalhes, estão maiores. Bem maiores. Parece que ganhei uma lupa de brinde e no começo estava em êxtase, completa alegria desmedida, por conta de dois olhos vivos, atentos.

 A curiosidade tem me feito sentir cheiros, e aqui, pentelho, a coisa fede, e como fede!
Toda magia da sensibilidade, também, me fez efeito. Agora eu enxergo muito melhor. No começo, comecei enxergando a ausência de postes em determinadas ruas daqui. Depois, gestos cotidianos ficaram cada vez maiores e mais desenhados com o tempo, e agora, a cereja do bolo, já começo a perceber os detalhes.
Vejo homens se fundindo ao cimento enrolados, de cobertas ao chão, enquanto homens parecidíssimos com estes mesmo homens do chão, pulam com tamanha destreza, estes empecilhos vivos, que nem tiram a cabeça da tela do smartphone pra seguir seu caminho.
Vejo outros homens empunhando respeito, seriedade e integridade, sentados em poltronas confortáveis na calcada e com os pés esticados, sendo lustrados por pequenos homens, ou homens sujos, ajoelhados ali. Esses homens de roupas caras, estão nos dizendo o quanto eles são independentes e poderosos, e eu me perguntando se ele alguma vez lavou a própria cueca ou lustrou o próprio sapato. Com tanta importância e autoridade, não há tempo de fazer a própria comida, isso não deve ser importante. Parece que com dinheiro as coisas ficam mais fáceis, ou mais estranhas.

Depois disso, meus olhos ficaram trêmulos e não gostei do que vi. Espero que esteja bem ai em seu ninho. Apareça por aqui e venha distribuir sorrisos em meu peito tão batido de cinza.
Mande-me noticias. Espero ansioso sua visita, também.
De seu Amigo e Parceiro,

                                                                                                                        Celso Junior

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